Quem navega pelas águas dos rios Paranaíta e Santa Helena observa e estranha a presença de vigas de concreto carimbadas com a logo do viaduto da UFMT – uma das obras mais polêmicas e emblemáticas do pacote da Copa – em duas pontes de concreto. Coincidência ou não, um dos tantos questionamentos sobre a construção do viaduto se refere justamente ao suposto “sumiço” de cerca de 70 metros de vigas.
O encurtamento da obra foi tratado, inclusive, no âmbito na CPI da Copa, criada em março de 2015, e pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que à época apontou uma diferença entre o cumprimento previsto no projeto e o executado. Em abril do ano passado foi aprovado o relatório final da CPI, que sugeriu o indiciamento de sete agentes políticos, 96 agentes públicos, 16 empresas privadas e sete consórcios de empresas. Além disso, indicou a devolução de R$ 541,1 milhões aos cofres públicos.
O deputado estadual Oscar Bezerra (MDB) presidiu a CPI e comenta que a comissão detectou que houve encurtamento do viaduto. “Ali foi encurtado, foi feito menos metros do que estava previsto no projeto original. Obviamente readequaram o projeto para prestar contas, mas para conseguir o dinheiro era um tanto de metro e depois foi bem menos, uns 50 a 60 metros a menos”, lembra o parlamentar ao acrescentar que o relatório da CPI foi encaminhado aos órgãos de controle.
O viaduto da UFMT integra o conjunto de obras da Copa de 2014 e é uma das intervenções necessárias para implementação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que deveriam ter sido concluídas naquele ano, mas desde então estão paradas. A obra foi orçada em R$ 23 milhões, iniciada em 2012 e inaugurada em dezembro de 2013.
A secretaria estadual de Cidades (Secid) precisou realizar obras de drenagem no entorno do elevado por conta dos constantes alagamentos sempre que chovia. Os serviços vão custar cerca de R$ 4 milhões. A Prefeitura de Cuiabá ficou responsável pelo paisagismo abaixo do elevado, o que deve ser concluído ainda este mês. Para que essa obra fosse realizada o governo contratou um estudo minucioso da UFMT que custou cerca de R$ 616 mil.
As duas pontes na região de Paranaíta (a 872 km de Cuiabá) foram construídas com vigas de concreto carimbadas, em tinta preta, com a seguinte informação: “SECOPA VIADUTO UFMT VIGA Nº: 001”. As imagens e um vídeo foram enviados anonimamente por um leitor do site .
A reportagem apurou que elas foram construídas, em 2013, pela Usina Hidrelétrica Teles Pires, que terceirizou a obra para a empresa de Belo Horizonte-MG, Rio Grande Engenharia e Construções, que, por sua vez, comprou as vigas da CIBE – Pré Moldados, de Primavera do Leste.
À reportagem, o engenheiro responsável pela Rio Grande, Ronaldo Andrade, informou que à época foram compradas aproximadamente 70 vigas da CIBE e com elas foram construídas quatro pontes entre Paranaíta e Alta Floresta (a 800 km da Capital). A equipe tentou por duas semanas, mas não conseguiu falar com os responsáveis da CIBE.
O engenheiro da Rio Grande afirma não ter informação sobre as marcações nas vigas e diz não se recordar da existência dos carimbos no momento em que as pontes foram construídas. “Imagino que o mesmo fabricante que fez as vigas para mim tenha feito um monte de obras, inclusive em Cuiabá, porque eu sei que ele fornecia, e pelo fato das vigas serem idênticas, ao invés de mandar para Cuiabá, mandou para lá (Paranaíta)”.
Ronaldo comenta que uma das quatro pontes citadas foi feita próximo à UHE, que fica entre Jacareacanga (PA) e Paranaíta, e possui 130 metros de cumprimento. Nesta obra foram usadas 25 das 70 vigas compradas da CIBE. Ele esclarece, por fim, que não tem relação com Estado ou a Prefeitura de Cuiabá.
Outro lado
O Consórcio VLT foi o responsável pela construção do viaduto da UFMT. Por meio de nota, declarou que todas as vigas adquiridas para a construção do referido viaduto foram recebidas e aplicadas no próprio elevado, não tendo sido efetuado pelo Consórcio qualquer remanejamento ou doação de materiais a terceiros. Afirma desconhecer qualquer procedimento neste sentido realizado pelo Estado. “O Consórcio VLT desconhece a origem da citada viga e a razão pela qual possui identificação relacionada à obra do VLT”.
O governo, por meio das secretarias estaduais de Infraestrutura e Logística (Sinfra) e de Cidades (Secid), reitera que as pontes são de responsabilidade da UHE e nega conhecimento sobre as marcações nas vigas.
O prefeito de Paranaíta, Antônio Domingo Rufatto (PSDB), conhecido como Tony, diz que pediu ao deputado estadual Romoaldo Junior (MDB) que intervisse junto ao ex-governador Silval Barbosa (sem partido) para que as pontes fossem construídas. “Abrimos mão de parte do ISSQN como contrapartida e restante o governo e a empresa fizeram”.
A reportagem apurou que não há investigação sobre um possível encurtamento do viaduto da UFMT nos Ministérios Públicos Estadual (MPE) e Federal (MPF). Informações do site RD News.